Sempre na linha da elegância e sofisticação, Pedro Reis deu cartas no programa de televisão Projecto Moda da RTP1.
Considerado pelo júri um valor seguro, designer de detalhes, perfeccionista, maduro, e com um futuro promissor, foi o concorrente com mais desafios ganhos revelando-se o mais consistente de todo o programa.
Ser finalista foi sem dúvida uma vitória que lhe abriu portas. A sua colecção final, inspirada no quadro "Ophelia" (uma personagem de Hamlet de William Shakespeare) de John Everett Millais, envolveu o público no dramatismo de um lago que arrebata a alma e se apodera do corpo…
HiimaB - O que o levou a concorrer ao Projecto Moda?
Pedro Reis - O motivo que me levou a concorrer ao PM foi o de querer mostrar o meu trabalho enquanto artista. Já há muito tempo que não "criava" nada que fosse realmente eu. Depois de anos a trabalhar para a industria têxtil precisava de reavivar esta "chama" que estava dentro de mim… Por isso quando surgiu o programa pensei que seria a melhor hipótese que teria para o fazer.
HB - Quais as maiores dificuldades que encontrou neste desafio geral?
PR - O factor TEMPO! O tempo real que tínhamos para realizar um desafio nunca era o que nos era dado, visto que dentro desse espaço de tempo tínhamos que gravar depoimentos, deslocar-mo-nos para outros locais de gravação, repetir "takes" porque alguns não ficavam bem.. Enfim, era um programa de Tv e tínhamos que ser um pouco "actores" às vezes… Por isso quando diziam que tínhamos 48h para fazer um desafio, em horas reais não passavam das 16 ou 18h na verdade...
Outro factor foi o técnico.. estávamos um pouco limitados pelas máquinas e pelos meios que tínhamos para executar as nossas peças, e às vezes era complicado costurar 12h seguidas com uma máquina doméstica…
PR - O apoio financeiro, a valorização do produto enquanto produto português, e a falta de visibilidade dadas aos criadores cá em Portugal.
HB - Já esteve ligado a empresas bastante comerciais, como o grupo Inditex. No fundo são empresas que levam a moda a um público vasto e a um preço acessível. Tendo sido considerado perfeccionista e detalhado, com sentido de sofisticação, como é conjugar estas características com as condicionantes de uma linha tão comercial?
PR - Para uma empresa comercial temos que pensar que as peças têm que ser acessíveis acima de tudo! Muitas vezes temos que reestruturar uma peça que idealizamos e simplificar ao máximo para que o preço não ultrapasse o target pretendido. Temos que pensar que as peças têm que ser “vestíveis”, com pormenores diferentes, que estejam dentro das tendências e do publico alvo. Eu sempre distingui um pouco o Pedro Reis "industrial" do Pedro Reis "artístico". Quando desenho para uma marca adapto-me ao estilo da marca e tento simplificar as coisas. Quando desenho para mim, aí sim, tento mostrar o máximo possível, abusar dos detalhes, experimentar formas novas… e não penso no custo dos materiais, nem no tempo dispendido na execução de uma peça.
HB - A opinião geral é que estes programas são óptimos para revelar novos talentos e mostrar, ainda que a um público nacional, o que bom se faz no país. Acha que um programa com este formato, onde se sorteiam tecidos, e os desafios são tão inesperados quanto circunscritos, é uma boa forma de filtrar os melhores?
PR - Este tipo de programas realmente é a forma mais fácil de ganhar dimensão, projecção a nível nacional de uma forma rápida, mas também efémera. Os desafios servem para nos testar, tirar-nos da zona de conforto, e realmente puxar pela nossa criatividade e capacidade de reacção. É de facto um bom filtro para captar os designer mais "desenrascados". Mas em relação aos melhores já é um pouco subjectivo, porque muitas vezes podemos ser muito bons mas… ninguém é bom em tudo, e às vezes um desafio pode correr-nos mal e arruinar o nosso percurso.
HB - Os comentários do júri foram produtivos e ajudaram-no a crescer como profissional? Até que ponto as opiniões e críticas podem limitar a criatividade ou a identidade de um designer?
PR - Os comentários do júri foram de facto construtivos e é sempre bom ouvir opiniões e criticas de pessoas com mais experiência que nós. Se queremos ser alguém temos que acreditar em nós acima de tudo, mas também temos que ver o ponto de vista das outras pessoas, para nos apercebermos realmente que há coisas que podem ser melhoradas no nosso trabalho. Depois podemos ignorar as críticas, aceitar ou aprender com elas. Penso que a única coisa que limita a criatividade de um designer é ele próprio. E se realmente faz aquilo que gosta, saberá analisar as críticas e aprender com elas, sem deixar de ser fiel a si mesmo.
Algumas das criações de Pedro Reis no programa.
HB - O que tem a dizer sobre o estilo dos portugueses? Estão atentos à moda? Têm gosto?
PR - Eu penso que os portugueses ainda não têm um estilo definido. Estamos cada vez mais a vestir-nos melhor e a estar atentos à moda, mas ainda há um certo receio em sermos realmente diferentes e termos um estilo distinto do resto das pessoas. As pessoas em Portugal ainda são um pouco "comedidas" em relação ao que vestem...
HB - Qual o seu conceito de mulher elegante?
PR - Para mim, uma mulher elegante é uma mulher confiante! Segura dela própria, e que brilha em qualquer lado: quer esteja de jeans e t-shirt, ou de vestido de noite. Ao pensar no meu conceito de mulher elegante só me ocorre a frase de Coco Chanel: "Look for the woman in the dress. If there is no woman, there is no dress."
HB - Quem gostaria de vestir, e porquê? PR - Todas as mulheres que correspondem ao meu conceito de mulher elegante…
HB - Alexander McQueen é um dos seus designers favoritos, e teve a oportunidade de criar um look para a Lady Gaga, uma das grandes clientes do designer… perante esta interessante fusão, qual foi a tendência… inspirou-se em McQueen ou em Lady Gaga?
PR - É impossível dissociar a Lady Gaga do Mcqueen... mas o look que criei não partiu nem de um nem de outro. Eu queria utilizar o silicone novamente. Achei que seria o desafio ideal para o fazer, visto que a Lady Gaga adora materiais diferentes e eu considero que é o material com que mais me identifico. Como era o ultimo desafio, tinha mesmo que mostrar aquilo que eu gostava e aquilo que eu sou como designer. Mas o silicone foi difícil de encontrar e confesso que desesperei um pouco… A produção só conseguiu o silicone preto no dia anterior ao desfile e até lá eu não tinha confirmação se o iria usar ou não, e andava às voltas a tentar encontrar alternativas... No espaço de tempo em que estava desesperadamente à espera de alguma resposta da produção, comecei a fazer uma coroa e a partir daí idealizei uma personagem - surgiu a ideia de fazer uma aristocrata em decadência... Depois da coroa fiz o manto, e assim que chegou o silicone fiz o vestido. No fundo a inspiração nem veio dela nem do Mcqueen mas sim da coroa que fiz...
HB - O formato da final do programa é muito diferente do original. O curto espaço de tempo, comparativamente aos programas estrangeiros, para preparar a colecção alterou o resultado final seu trabalho? O facto de ter tido o apoio do CITEVE compensou o pouco tempo?
PR - Xiiii... a final... sim, foi muito diferente do original. Fiquei extremamente orgulhoso de mim e da Carina porque tirando as gravações, as visitas ás fábricas, os castings das modelos e as viagens que tivemos que fazer, só tivemos 7 dias para fazer a colecção! 7 dias para fazer 8 coordenados é extremamente limitativo, e a colecção que eu idealizava precisava no mínimo de 15 ou 20 dias. Muitos pormenores que queria fazer não consegui. Tive que abdicar de looks-chave da colecção porque não tinha tempo para os fazer, e tive que simplificar ao máximo os coordenados. O resultado final não ficou como eu queria. A 3 dias do desfile ainda só tinha 2 coordenados feitos e tive que repensar bem a colecção. Cheguei a entrar em desespero porque o timming era muito pouco mesmo, e eu tinha que de alguma forma vestir as 8 modelos. No final compensou! Fiquei satisfeito com o meu trabalho, mesmo não sendo o que idealizara. Mas mesmo assim, consegui mostrar um pouco de mim numa versão simplificada.
O apoio do CITEVE foi importantíssimo, pois realmente tínhamos todas as condições ideais para trabalhar. Só foi pena não podermos usufruir de todos os recursos, pela falta de tempo que tivemos...
HB - Como foi ter trabalhado na sua colecção final ao lado da rival? Principalmente por terem gostos muito parecidos e ao mesmo tempo terem uma relação de companheirismo.
PR - No inicio eu e a Carina tentávamos manter sigilo do que íamos fazer, das nossas ideias, dos trunfos que tínhamos guardados nas mangas.. mas quando nos apercebemos que realmente estávamos os dois sozinhos, a trabalhar sobre pressão e com pouquíssimo tempo, acabámos por ser o apoio um do outro. Deixámos de lado a rivalidade e trabalhamos com o mesmo intuito: mostrar às pessoas que mais importante do que ganhar um prémio, é mostrar um bom trabalho. Como temos gostos parecidos valorizamos a opinião um do outro e nas alturas em que estávamos indecisos, ou bloqueados, contávamos com a opinião e com o apoio um do outro. Adorei trabalhar com a Carina! Estávamos os dois a lutar sozinhos contra centenas de "Velhos do Restelo" que criticavam o programa e a nossa prestação. No final, mostrámos que realmente não ficamos nada atrás dos concorrentes das versões estrangeiras.
HB - Relativamente ao prémio, enquanto que o programa original apoia o lançamento de uma linha própria, neste caso, entre outras coisas, é oferecido um curso numa conceituada escola em Milão. Acha menos prestigiante para com o que se faz por cá? Ainda será necessário ir para fora ter melhor formação e contactos para singrar?
PR - Ter um curso numa escola estrangeira é uma mais-valia em Portugal. Cá só valorizamos o que vem de fora e o que é feito cá não é reconhecido. Basta ver alguns exemplos como o Filipe Oliveira Baptista e pensar: se ele tivesse começado em Portugal, teria o reconhecimento que tem agora? Já participei em eventos e concursos lá fora e é uma diferença enorme em relação aos nacionais! Não nos eventos em si, mas sim nas pessoas. Os portugueses têm medo uns dos outros, não confiam nas pessoas, e acham-se os melhores em tudo! Lá fora há mais abertura, mais comunicação e interacção entre as pessoas… cá dentro não se pode dizer o mesmo...
HB - Sentiu que podia ter vencido a final? Foi sem dúvida o concorrente mais constante, ter corrido mais riscos na final podia ter feito a diferença?
PR - O meu objectivo no programa era mostrar o meu trabalho. A minha meta era mesmo apresentar uma colecção na final, e consegui. Acho que cheguei à final já como vencedor: o meu objectivo tinha sido cumprido e isso para mim era o mais importante...
Alguns dos outfits da colecção final
HB - Projectos para o futuro?...
PR - Isso agora é uma pergunta difícil… gostava de lançar a minha marca própria, mas sem ajudas financeiras não é possível. Entretanto têm surgido várias propostas de trabalho e tenho que me debruçar sobre elas e pensar bem quais aceitar…
HB - Alguma mensagem especial para os leitores?
PR - Queria dar um agradecimento muito especial aos leitores e às pessoas que seguiram o programa. Não há palavras para descrever aquilo que sinto quando alguém me aborda nas ruas a felicitar-me pelo meu trabalho! Não estava à espera que tivesse tanto reconhecimento como tenho tido. Queria agradecer à Helena a oportunidade que me deu de poder falar um pouco sobre mim nesta entrevista. E acima de tudo, mandar um beijinho muito grande àquelas pessoas que me apoiaram durante o programa, e que nunca me deixaram ir abaixo. Penso que com o programa os portugueses aprenderam que em Portugal também se fazem coisas boas! Há bons designers por aí, e espero que daqui para a frente valorizem mais aquilo que é nosso...
A todos um bem-haja e um até breve...
Pedro, ficamos a aguardar novidades do seu sucesso!
2 comentários:
Perfeccionismo? Objectividade? eu atribuo a ambos.
PR e HB, congratulations !!!
Sónia C.
Já nasces-te com este dom!! A imagem que tenho de ti, era ver-te nos intervalos das aulas ou nos tempos livres a desenhar bonecos com roupas!! lol. Devias ter ganho tu!! Beijoca
Enviar um comentário